Durkheimianas I Consciência moral Quando nossa consciência fala, é a sociedade que fala em nós? Autoridade imperativa A disciplina e as regras A importância social da escola O que esperar do professor? Como deve ser a escola? O altruísmo Anomia Coesão Consciência coletiva Fatos sociais: maneiras de agir, de pensar e de sentir Fatos sociais: exteriores ao indivíduo Fatos sociais: um poder de coerção O desvio A perspectiva funcionalista As normas Crítica à tendência de reduzir os fenômenos sociais à psicologia individual Renunciar a fazer da psicologia o ponto de partida e de chegada de suas incursões no mundo social A função da divisão do trabalho Ordem, harmonia e solidariedade social Justiça Suicídio egoístico – baixa coesão social Distinção entre doença e saúde Quais as causas da doença? Desenvolver um tratamento que venha a debelar a doença O papel prático do sociólogo tem semelhança com o do médico? Fatos sociais como se fossem coisas A religião e as suas funções coesivas O gosto pela observação pode fazer de um homem um sociólogo A quem devemos a liberdade de pensar que desfrutamos atualmente? Professor: aproveitar todos os acontecimentos da vida escolar para despertar bons sentimentos DURKHEIMIANAS 2 ... As crenças e práticas sociais agem sobre nós a partir do exterior... A liberdade filosófica teve por precursores toda a espécie de heréticos que o braço secular justamente castigou durante todo o curso da Idade Média, até a véspera dos tempos contemporâneos. Quando, pois, procuramos explicar um fenômeno social, é preciso buscar separadamente a causa eficiente que o produz e a função que desempenha. Existem sempre vários caminhos que levam a um objetivo visado; é preciso, pois, escolher entre eles. O que reclama do sociólogo é que se coloque num estado de espírito semelhante ao dos físicos, químicos, fisiologistas, quando se aventuram numa região ainda inexplorada de seu domínio científico. ... Todas as vezes que um fenômeno social está explicado diretamente por um fenômeno psíquico, pode-se estar certo de que a explicação é falsa. ... se o suicídio depende de mais de uma causa, é porque, em realidade, existem várias espécies de suicídios. Não há dúvida de que o próprio crime pode apresentar formas anormais; é o que acontece quando, por exemplo, atinge taxas exageradas. Não há dúvida, também, de que tal excesso seja de natureza mórbida. ... O objetivo de toda ciência é descobrir, e toda descoberta desconcerta mais ou menos as opiniões formadas. Estender à conduta humana o racionalismo científico é, realmente, nosso principal objetivo. ... um método, que acreditamos mais preciso, adaptado de maneira mais exata à natureza particular dos fenômenos sociais. Segundo o direito ateniense, Sócrates era criminoso e sua condenação não deixou de ser justa. Todavia, seu crime, isto é, a independência de seu pensamento, não foi útil apenas à humanidade como também à sua pátria. A primeira tarefa do sociólogo deve ser, pois, definir as coisas de que trata a fim de que se saiba, e de que ele próprio saiba, do que está cuidando. ... O sociólogo deveria afastar as noções antecipadas que formula a respeito dos fatos para poder encarar estes próprios fatos;... O homem é, pois, refratário à vida comum, não se resigna a esta senão forçado. ... nossas crenças políticas e religiosas, nossas práticas morais nos apaixonam, o que não acontece com as coisas do mundo físico;... A sociologia não é, pois, o anexo de nenhuma outra ciência; constitui ela mesma uma ciência distinta e autônoma,... ... o sentimento do que a realidade social apresenta de especial... Necessário ao sociólogo que somente uma cultura especialmente sociólogica pode prepará-lo para compreender os fatos sociais ... É preciso desconfiar sempre das primeiras impressões, - eis o preceito que sempre se deve ter em mente. ... Recusa em admitir nosso princípio fundamental, - a realidade objetiva dos fatos sociais, - ou de não admiti-lo sem reservas ... uma ciência não pode considerar-se como definitivamente constituída senão quando tiver conseguido formar uma personalidade independente. ... construir uma sociologia que veria no espírito de disciplina a condição essencial de toda vida em comum, fundando-a ao mesmo tempo na razão e na verdade. A função de um fato social não pode ser senão social, isto é, tal função consiste na produção de efeitos sociais úteis. E até não está de modo algum provado que a tendência à sociabilidade tenha sido, desde sua origem, um instinto congenital do gênero humano. DURKHEIMIANAS 3 Durkheim – A liberdade é filha da autoridade bem compreendida Durkheim – A escola não deve estar ligada a partidos e o mestre falta a seus deveres quando usa da autoridade de que dispõe para conduzir seus alunos na trilha de suas convicções pessoais, por mais justificadas que possam lhe parecer. Durkheim – Quanto melhor conhecermos a sociedade, melhor poderemos compreender tudo que se passa nesse microcosmo social que é a escola. Um corpo docente sem fé pedagógica é um corpo sem alma O futuro não se improvisa; só podemos construí-lo com os materiais que temos do passado. Não importa o que se tenha dito, não se nasce criminoso;... A educação não passa do meio pelo qual a sociedade prepara, no coração das crianças, as condições essenciais de sua própria existência. De que pode valer uma especulação pedagógica sem nenhuma base, ou cujas bases, quando não totalmente ausentes, não possuam solidez? Ora, que é a pedagogia senão a reflexão aplicada, o mais metodicamente possível, às coisas da educação, visando regular-lhes o desenvolvimento? Por meio da educação no e pelo indivíduo a sociedade atinge seu fim: a preservação e reprodução de sua própria existência (Weligton Paz) Mas o medo do castigo é completamente distinto do respeito à autoridade ... a autoridade moral é a qualidade mestra do educador, pois é pela sua autoridade que o dever é dever. A educação é, acima de tudo, o meio pelo qual a sociedade renova perpetuamente as condições de sua própria existência. O homem que a educação deve em nós realizar não é o homem como a natureza o fez, mas como a sociedade quer que ele seja. Constituir esse ser (social) em cada um de nós, tal é a finalidade da educação. Não reconhecemos expressamente que devemos à educação o melhor de nós mesmos? Numerosos os sábios célebres por sua ciência e que, no entanto, são como crianças em tudo que se ache fora de sua especialidade. Mas a ação jamais transcorre sem riscos; a ciência, por mais avançada, não conseguiria suprimi-los. É vão acreditar que educamos nossas crianças como bem entendemos. Somos forçados a seguir as regras reinantes no meio social em que vivemos. Desnecessário frisar que a autoridade, assim entendida, nada tem de violência ou opressão; consiste inteiramente numa certa ascendência moral. Não se decreta o ideal; é preciso que seja compreendido, amado, desejado por todos os que têm o dever de realizá-lo. A partir do momento em que se reconhece a educação como função essencialmente social, o Estado não pode dela se desinteressar. Através de nosso exemplo, das palavras que pronunciamos, dos atos que realizamos, moldamos continuamente a alma de nossas crianças. A ciência e o espírito crítico, hoje colocados num patamar tão alto, foram encarados com suspeita durante muito tempo Não visa, afinal, toda reforma pedagógica fazer com que os alunos sejam, sobretudo, homens de seu tempo? Quanto menor a reflexão, maior o imobilismo. Como poderia ser diferente se, na universidade, cada grupo de estudantes recebe seu aprendizado preferido numa espécie de compartimento estanque? Considero, na verdade, como postulado de toda especulação pedagógica, que a educação é coisa eminentemente social, tanto por suas origens como por suas funções... Uma classe é uma pequena sociedade e não se deve conduzi-la como se não passasse de mera aglomeração de sujeitos independentes uns dos outros. A reflexão, com efeito, é inimiga natural da rotina. Educação é a ação exercida sobre as crianças pelos pais e professores. Tal ação é constante, geral. Se, amanhã, encerrarmos a era do humanismo, saibamos reter o que dele deve ser retido. O futuro não pode ser evocado do nada; só podemos construí-lo com os materiais legados pelo passado. A cultura pedagógica deve, portanto, ter uma base largamente histórica. As formas elementares da vida religiosa (DURKHEIMIANAS 5) Uma sociedade é o mais forte feixe de forças físicas e morais que a natureza nos põe diante dos olhos. Um é aquele no qual arrasta monotonamente a sua vida cotidiana; ao contrário, não pode penetrar no outro sem entrar imediatamente em contato com forças extraordinárias que o galvanizam até o frenesi. (Profano e sagrado) ... todos os partidos, políticos, econômicos, confessionais, cuidam de provocar reuniões periódicas onde os seus adeptos possam revivificar a sua fé comum, manifestando-a em comum. ...ver a religião apenas pelo seu lado idealista é simplificar arbitrariamente as coisas: ela é realista à sua maneira. Um deus não é unicamente uma autoridade de que dependemos; é também uma força sobre a qual se apoia a nossa força. A única maneira de escapar totalmente à vida profana é fugir totalmente da vida, de uma vez por todas (suicídio religioso) Templos e santuários: são parcelas de espaço reservadas às coisas e aos seres sagrados e que lhes servem de moradias;... O caráter sagrado de que se reveste uma coisa não está implicado nas suas propriedades intrínsecas: é-lhe acrescentado Toda religião, além de ser disciplina espiritual é também uma espécie de técnica que permite ao homem enfrentar o mundo com mais confiança. Retiremos do homem a linguagem, as artes, as crenças da moral e ele cai ao nível da animalidade. Contrariamente às aparências, verificamos que as realidades a que se aplica então a especulação religiosa são exatamente aquelas que mais tarde servirão como objetos para a reflexão dos pensadores: a natureza, o homem, a sociedade. ... se os próprios povos foram os artesãos desse sistema de ideias errôneas, ao mesmo tempo em que eram enganados por elas, como esse logro extraordinário pode perpetuar-se em todo o decurso da história? Desde o início da história, as crenças religiosas manifestam tendência a não se encerrar em sociedade política estreitamente delimitada; há nelas como que uma atitude natural de ultrapassar as fronteiras; a se difundir, a se internacionalizar. Igreja: comunidade moral O que constitui essencialmente o culto é o ciclo das festas que voltam regularmente em épocas determinadas. Como vã fantasmagoria teria podido modelar as consciências humanas tão fortemente e de maneira tão duradoura? A extrema facilidade com a qual as forças religiosas se irradiam e se difundem nada terá, pois, de surpreendente se forem concebidas como exteriores aos seres nos quais residem. A vida social, em todos os seus aspectos e em todos os momentos da sua historia, só é possível graças a vasto simbolismo. Os Bororo, do Brasil, representam a sua alma sob o aspecto de pássaro e, por essa razão, acreditam ser pássaro dessa mesma variedade. No decorrer da iniciação chega a acontecer de os adultos abrirem as veias e banharem o noviço com o seu sangue;... ... todos os elementos essenciais do pensamento e da vida religiosa devem se encontrar, pelo menos em germe, já nas religiões mais primitivas... As forças religiosas Mas sabemos que não existe religião que não tenha aspecto individual O homem é transportado fora de si mesmo, distraído de suas ocupações e de suas preocupações ordinárias. O que a ciência contesta na religião não é o direito de ser, mas o direito de dogmatizar sobre a natureza das coisas, é a espécie de competência especial que ela se atribui para conhecer o homem e o mundo. O trabalho é a forma eminente da atividade profana: não tem outro objetivo evidente senão prover às necessidades temporais da vida; coloca-nos em relação unicamente com coisas vulgares ... os ritos ascéticos implicam privações, abstinências, mutilações, mas que devem ser suportados com firmeza impassível e uma espécie de serenidade. Perceber a função religiosa que é atribuída à dor desde as sociedades inferiores. Não podemos nos desvencilhar dele (mundo profano) sem exercer violência à nossa natureza, sem ferir dolorosamente os nossos instintos. Mostrando na religião uma coisa essencialmente social, absolutamente não pretendemos dizer que ela se limita a traduzir, em outra linguagem, as formas materiais da sociedade e as suas necessidades vitais imediatas ... a religião tem fascínio que não é dos seus menores atrativos Sob o símbolo, é preciso saber atingir a realidade que representa e que lhe dá a sua representação verdadeira. Postulado essencial da sociologia é que uma instituição humana não poderia repousar sobre o erro e a mentira: sem isso ela não conseguiria durar Por toda parte ela responde à mesma necessidade e deriva do mesmo estado de espírito. Mitos se formaram para tornar mais facilmente compreensível aos espíritos essa estranha ambiguidade da natureza humana. RELIGIÃO E O ESTADO DE DESREGRAMENTO OU ANOMIA O FERVOR RELIGIOSO DO FANÁTICO A RELIGIÃO É, DECIDIDAMENTE, O SISTEMA DE SÍMBOLOS PELOS QUAIS A SOCIEDADE TOMA CONSCIÊNCIA DE SI MESMA; É A MANEIRA DE PENSAR PRÓPRIA DO SER COLETIVO SOCIEDADE RELIGIOSA E COESÃO NÃO É COM DEMONSTRAÇÕES DIALÉTICAS QUE SE DESENRAÍZA A FÉ RELIGIÃO: “ADMINISTRAÇÃO DO SAGRADO” “IMENSA EMPRESA DE SIMBOLISMO” “DINAMOGÊNICA” – RELIGIÃO = AÇÃO = VIDA PARA UMA VIDA SOCIAL SEM ANOMIA “A SOCIEDADE IDEAL NÃO ESTÁ FORA DA SOCIEDADE REAL; FAZ PARTE DELA” MUNDO RITUAL: CONJUNTO SIMBÓLICO – EXPRESSIVO ENERGETIZADO PELAS POTÊNCIAS EMOCIONAIS APENAS O HOMEM TEM A FACULDADE DE CONCEBER O IDEAL E DE ACRESCENTÁ – LO AO REAL “ENQUANTO HOUVER SOCIEDADES HUMANAS, ELAS TIRARÃO DO SEU SEIO GRANDES IDEAIS, DOS QUAIS OS HOMENS SE FARÃO OS SERVIDORES” “TEMPO DE RENASCIMENTO DO MISTICISMO” E A “FÉ NO FUTURO DA RAZÃO” A GÊNESE SOCIETÁRIA DA RELIGIÃO E A GÊNESE RELIGIOSA DA SOCIEDADE O SUICÍDIO (Estudo de Sociologia) DURKHEIMIANAS 6 Cada sociedade está predisposta a fornecer um contingente determinado de mortos voluntários. ... Quanto aos motivos que determinam o suicídio... Os fatores extra-sociais Suicídio maníaco: Deve-se quer a alucinações, quer a ideias delirantes. Suicídio melancólico – ligado a um estado geral de extrema depressão, de tristeza exagerada. Uma moral demasiado risonha é uma moral frouxa; só convém aos povos em decadência e é apenas entre eles que a encontramos. O suicídio, portanto, é reprovado por transgredir o culto à pessoa humana no qual repousa toda a nossa moral. O suicídio varia na razão inversa do grau de integração dos grupos sociais de que o indivíduo faz parte. A melancolia, portanto, só é mórbida quando ocupa um lugar excessivo na vida; mas não é menos mórbido excluí-la completamente. ... De maneira geral, a religião exerce uma ação profilática sobre o suicídio. ... Quanto mais numerosas e importantes essas situações coletivas, mais a comunidade religiosa é fortemente integrada; maior também é sua virtude de preservação. As sociedades maometanas proíbem o suicídio com a mesma energia. “O homem”, diz Maomé, “só morre pela vontade de Deus segundo o livro que determina o termo de sua vida”. –“Quando o termo chegar, eles não o poderão retardar nem adiantar em um só instante”. ... Comumente todo suicida é representado como um melancólico para quem a existência é um fardo. Corrente suicidógena Assim se formam correntes de depressão e de desencanto que não emanam de nenhum indivíduo em particular, mas que exprimem o estado de desagregação em que se encontra a sociedade. O egoísmo não é apenas um fator auxiliar dele; é sua causa geradora. Se, nesse caso, o vínculo que liga o homem à vida se solta, é porque o próprio vínculo que o liga à sociedade se afrouxou. O suicídio é considerado imoral, em si mesmo, por si mesmo, seja quem for que participe dele. Assim, à medida que avançamos na historia, a proibição, em vez de se atenuar, torna-se mais radical. O homem procura se instruir e se mata porque a sociedade religiosa de que ele faz parte perdeu sua coesão; mas ele não se mata por se instruir. Há homens que resistem a infelicidades terríveis, ao passo que outros se suicidam após leves aborrecimentos. Aliás, já mostramos que os indivíduos que mais sofrem não são os que mais se matam. Todas as vezes que se produzem graves rearranjos no corpo social, sejam eles devidos a um súbito movimento de crescimento ou a um cataclismo inesperado, o homem se mata mais facilmente. Há um humor coletivo, assim como há um humor individual, que inclina os povos à tristeza ou à alegria, que os faz ver as coisas sob cores claras ou escuras. Porque a sociedade é o todo, o mal que ela sente transmite-se às partes de que é constituída. ... O suicídio depende principalmente, não das qualidades congênitas dos indivíduos, mas das causas que lhes são exteriores e que os dominam! Suicídio egoísta – Apatia Suicídio egoísta – Melancolia indolente com complacência por si mesma Suicídio egoísta – Sangue-frio desencantado do céptico Suicídio altruísta – Energia passional ou voluntariosa Suicídio altruísta – Com sentimento tranquilo de dever Suicídio altruísta – Com entusiasmo místico Suicídio altruísta – Com coragem tranquila Suicídio anômico – Irritação, desgosto, Suicídio anômico – Recriminações violentas contra a vida em geral Suicídio anômico – Recriminações violentas contra uma pessoa em particular (homicídio – suicídio) Tipos mistos – Suicídio ego-anômico – Mistura de agitação e apatia, de ação e devaneio. Tipos mistos – Suicídio anômico-altruísta – Efervescência exasperada Tipos mistos – Suicídio ego-altruísta – Melancolia moderada por uma certa firmeza moral É fato conhecido que as crises econômicas têm uma influência agravante sobre a propensão ao suicídio. Já em 452, o concílio de Arles declarou que o suicídio era um crime e só podia ser efeito de um furor diabólico. A partir do momento em que a pessoa humana é e deve ser considerada como algo sagrado, de que nem o indivíduo nem o grupo podem dispor livremente, qualquer atentado contra ela deve ser proscrito. Se o indivíduo se isola, é porque os laços que o uniam aos outros estão frouxos ou rompidos, é porque a sociedade, nos pontos em que ele tem contato com ela, já não está fortemente integrada. Se a mulher se mata muito menos do que o homem, é porque ela é muito menos engajada do que ele na vida coletiva e, portanto, sente com menos força sua ação boa ou má. O suicídio é muito mais urbano do que rural A atual situação do suicídio entre os povos civilizados deve ser considerada normal ou anormal? Não se pode portanto, sem fazer mau uso das palavras, considerar todo suicida um louco. Um se desliga da vida porque, não percebendo nenhum objetivo ao qual se possa agarrar, sente-se inútil e sem razão de ser;... A superioridade do protestantismo do ponto de vista do suicídio provém do fato de ele ser uma Igreja menos fortemente integrada do que a Igreja Católica. DA DIVISÃO DO TRABALHO SOCIAL – DURKHEIMIANAS 7 As paixões humanas só se detêm diante de uma força moral que elas respeitam. ... A moral é o mínimo indispensável, o estritamente necessário, pão cotidiano sem o qual as sociedades não podem viver Há uma moral profissional do advogado e do magistrado, do soldado e do professor, do médico e do padre, etc. A saúde geral do corpo social A crise que sofremos não decorre de uma só e única causa A vida social deriva de uma dupla fonte: a similitude das consciências e a divisão do trabalho social Uma sociedade composta de uma poeira infinita de indivíduos desorganizados, que um Estado hipertrofiado se esforça por encerrar e reter, constitui uma verdadeira monstruosidade sociológica Todo o passado nos retém para trás, mesmo que as mais belas perspectivas nos atraiam para a frente. É uma operação sempre laboriosa, a de desarraigar hábitos que o tempo fixou e organizou em nós. Não basta uma geração para desfazer a obra das gerações, para pôr um homem novo no lugar do antigo As personalidades particulares se constituem, adquirem consciência de si e, no entanto, esse aumento da vida psíquica do indivíduo não debilita a da sociedade, mas apenas a transforma. ... Ser uma pessoa é ser uma fonte autônoma de ação. Portanto, o homem só adquire essa qualidade na medida em que há nele algo que lhe é próprio, só dele e que o individualiza, na medida em que ele é mais do que uma simples encarnação do tipo genérico da sua raça e de seu grupo. ... O suicídio só aparece com a civilização. ... O verdadeiro suicídio, o suicídio triste, se encontra em estado endêmico entre os povos civilizados. ... É necessário que a inteligência guiada pela ciência adquira uma importância maior no curso da vida coletiva Fazer a ciência da moral Um estado de saúde moral Um ato é criminoso quando ofende os estados fortes e definidos da consciência coletiva. ... Se não formos convidados a cada instante a exercer sobre nós essa coerção sem a qual não há moral, como nos acostumaríamos a ela? ... Constatado o mal, qual é sua causa e qual pode ser seu remédio? O que o governo é para a sociedade em sua totalidade, a filosofia deve sê-lo para as ciências. As sociedades superiores só se podem manter em equilíbrio se o trabalho for dividido. Assinalar na divisão do trabalho algo mais que um fenômeno puramente econômico Estudamos a solidariedade social através do sistema das regras jurídicas Tratar os fatos da vida moral a partir do método das ciências positivas. Os pontos pelos quais estamos em contato com ele se multiplicam, assim como as ocasiões em que ele por encargo chamar-nos ao sentimento da solidariedade comum (estado) A ciência da moral: ensina a respeitar a realidade moral e fornece os meio de melhorá-la Por que razão o indivíduo suscitaria, por si mesmo, mudanças que sempre lhe custam alguma dificuldade, se delas não retirasse mais felicidade? O cérebro tem sua importância, mas o estômago também é um órgão essencial, e as doenças de um são tão ameaçadoras para a vida como as do outro. ... A pena tão generalizada de talião porventura não é uma satisfação dada à paixão da vingança? Mas, hoje, dizem, a natureza da pena mudou; não é mais para se vingar que a sociedade pune, é para se defender. Para que estigmatizar um homem que não deve mais viver na companhia de seus semelhantes e que provou abundantemente, por sua conduta, que as mais temíveis ameaças não bastam para intimidá- lo? A diversidade é, pois, tanto maior quanto mais desenvolvidos forem os tipos individuais. A família é uma espécie de sociedade completa, cuja ação se estende tanto a nossa atividade econômica quanto a nossa atividade religiosa, política, científica, etc. Tudo o que fazemos de alguma importância, mesmo fora de casa, nela ecoa e provoca reações apropriadas. ... A única personalidade moral que está acima das personalidades particulares é a formada pela coletividade. Na realidade, a vida social, onde é normal, é espontânea; e se é anormal, não pode durar. As sociedades inferiores O que dá força aos estados coletivos não é apenas o fato de serem comuns à geração presente, mas sobretudo o de serem, em sua maioria, um legado das gerações anteriores. Do fato de que o filho de um ladrão se torne ele mesmo ladrão não decorre que sua imoralidade seja uma herança que seu pai lhe legou. ... A ciência nada mais é que a consciência levada a seu mais alto ponto de clareza. ... a arte, que é absolutamente refratária a tudo o que parece uma obrigação, porque é o domínio da liberdade. A divisão do trabalho não põe em presença indivíduos, mas funções sociais. ... No fundo, o que a consciência comum afirma não é que a hereditariedade não existe, mas que seu peso é menor, e a ciência, como veremos, nada tem que contradiga esse sentimento. A primeira condição para que um todo seja coerente é que as partes que o compõem não se choquem em movimentos discordantes. ... Uma crise econômica, uma jogada na Bolsa, até mesmo uma falência podem desorganizar o corpo social de maneira muito mais grave do que um homicídio isolado. O patrimônio hereditário conserva um enorme valor, mais não representa mais que uma parte cada vez mais restrita da fortuna individual. O único fato experimental que demonstra ser a vida geralmente boa é que a esmagadora maioria dos homens prefere-a à morte. Se temos uma viva inclinação a pensar e agir por nós mesmos, não podemos ser fortemente inclinados a pensar e agir como os outros. A civilização se concentra nas grandes cidades; o suicídio também. Quais são as condições climáticas, geológicas ou até mesmo sociais capazes de ter dado origem a talentos tão diferentes quanto os do matemático, do químico, do naturalista, do psicólogo, etc.? O ser mais simples e o ser mais complexo desfrutam de uma mesma felicidade, se realizam igualmente sua natureza. O selvagem normal pode ser tão feliz quanto o civilizado normal. A caso não é notável que o culto fundamental das religiões mais civilizadas seja o do sofrimento humano? A EDUCAÇÃO MORAL – Durkheimianas 8 O centro gravitacional da vida moral, que outrora residia na família, tende a deslocar-se cada vez mais. Um povo que não está preparado para os deleites da arte é um povo bárbaro. É preciso proceder a uma refundação de nossas técnicas educativas. O homem sente-se tanto mais disposto a matar-se quanto mais desapegado está da coletividade, em um estado egoísta. A moral é um vasto sistema de interdições. Isso quer dizer que seu objetivo consiste em delimitar o círculo no qual a atividade individual pode acontecer,... ... A primeira tarefa da educação moral é ligar a criança à sociedade que a circunda de maneira mais imediata, isto é, a família. A atividade moral tem por finalidade os seres, superiores aos indivíduos, mas tão empíricos, tão naturais quanto os minerais e todos os seres viventes: estes seres são as sociedades. Esse é o ser concreto e vivente que nos impõe limites e, quando sabemos o que é esse ser, não nos espantamos mais com a potência de sua ação. O prazer não pode ser a única coisa que possui algum valor e que merece ser buscada. Acima de tudo, é preciso criar uma alma, e é preciso preparar essa alma na criança. Deixar a falta impune é algo muito grave; punir inocentes é algo muito cruel. ... Egoísmo e altruísmo são duas manifestações contemporâneas e estreitamente entrelaçadas em toda forma de vida consciente. ... Nosso racionalismo deve se desemaranhar desse simplismo, aprender a desconfiar das explicações fáceis e formais, deixar-se penetrar cada vez mais pelo sentimento de complexidade das coisas. A sociedade é, antes de tudo, uma consciência: é a consciência da coletividade. ... Cada geração possui seu humor próprio, sua própria maneira de pensar e sentir, suas necessidades, suas aspirações especiais. A sociedade, com efeito, é um todo enormemente complexo. O que é, com efeito, a disciplina, senão a sociedade enquanto ela nos comanda, nos dita ordens, nos dá leis? Mas o indivíduo real, o indivíduo que somos, é a própria complexidade; em cada um de nós reside uma multiplicidade de aptidões, de propriedades, algumas em ato, outras ainda em potência, outras em vias de formação,... Estamos engajados com o projeto de oferecer em nossas escolas uma educação inteiramente racional, isto é, livre de qualquer princípio extraído das religiões reveladas. A partir do momento em que é racionalizada, a moral pode sair desse imobilismo, ao qual estava logicamente condenada enquanto permanecia apoiada sobre uma base religiosa. ... Não poderemos instituir uma educação laica se não pudermos oferecer ao indivíduo um fim que o transcende, se não pudermos oferecer-lhe um objeto para essa necessidade de devotar-se e de sacrificar-se, que é a raiz de toda vida moral. ... É a sociedade que é a detentora de todas as riquezas da civilização; é ela que as conserva e que as acumula; é ela que as transmite de geração a geração; é através dela que chegam até nós. Portanto, é a ela que devemos essas riquezas, é dela que as recebemos. Inclusive os sentimentos mais generosos, como o amor pelos animais ou pelas outras pessoas, quando excedem determinada medida, são indicação de alguma alteração comportamental. Não existe povo que não tenha sua moral: o que ocorre é que a moral das sociedades inferiores não é a mesma que a nossa. Aquilo que caracteriza a moral dessas outras sociedades é que se trata de uma moral essencialmente religiosa. Um dos principais objetivos da educação moral consiste em dar à criança o sentimento de sua dignidade de ser humano. ... A incapacidade de permanecer dentro de certos limites é, para todas as formas de atividade e, mais geneticamente, para todos os tipos de atividade biológica, um sinal de morbidez. Considerando que a moral e a religião são intimamente ligadas, esse caráter sagrado se explica facilmente, uma vez que a moral, assim como a religião, é concebida como sendo dependente e resultante da divindade, fonte de tudo aquilo que é sagrado. Do mesmo modo que o padre é o intérprete de Deus, o professor é intérprete das grandes ideias morais de seu tempo e de seu país. Uma das precauções mais eficazes é impedir que a criança seja formada em um único meio e, mais ainda, por uma única pessoa. Todo mundo sabe que, em uma multidão ou em uma assembleia, as emoções e as paixões afloram, de forma muito diversa do que seriam experimentadas pelos indivíduos, se essas emoções e paixões os afetassem isoladamente, em vez de afetá-los enquanto um corpo social. Quais são essas causas, por quais razões a escola, o lar da cultura humana, foi, por uma espécie de necessidade constitutiva, o lar da barbárie? ... A arte é uma brincadeira. A moral, ao contrário, faz parte da vida séria. Na verdade, ela constitui aquilo que existe de mais sério, de mais grave na vida séria. ... Kant demonstrou melhor do que qualquer pessoa que havia algo quase religioso no sentimento que a lei moral inspira até mesmo na razão mais elevada;... O personagem literário que pode ser apresentado como a encarnação desse sentimento do infinito é o Fausto de Goethe. Não foi à toa que o poeta o retratou como indivíduo minado por um tormento perpétuo. Um ser com personalidade é um ser capaz de imprimir sua própria marca em tudo o que faz, uma marca que lhe é peculiar, que é constante, pela qual ele é reconhecido e se distingue de todos os demais. É preciso que exista uma diversidade de professores que se sucedem para impedir que a influência de algum deles seja muito exclusiva e, portanto, muito opressora da individualidade da criança;... ... Não seria possível que conseguíssemos nos conter a nós próprios, mediante um esforço interior, sem que uma pressão exterior fosse perpetuamente exercida sobre nós? O que a moral nos ordena é amar o grupo do qual fazemos parte, os homens que compõem esse grupo, o solo que eles ocupam, todas as coisas concretas e reais, que devemos ver tal qual são realmente, mesmo quando nosso objetivo é elevá-los ao maior grau possível de perfeição. A educação moral não pode estar rigorosamente encerrada no horário das aulas; ela não acontece num momento específico e predeterminado; ela acontece a todo instante. As relações morais são relações entre consciências. Ora, fora e acima do ser consciente que sou eu, e fora e acima dos outros indivíduos, não existe nada a não ser o ser consciente que é a sociedade. É sempre ruim aproximar muito os sujeitos que têm um valor moral medíocre; eles apenas se estragam mutuamente. É preciso que o professor acredite, não nele, não nas qualidades superiores de sua inteligência ou de sua vontade, mas em sua missão, na grandeza de sua missão. Uma sociedade em que as transformações ocorrem pacificamente, sem qualquer sorte de conflito, mas que não trazem nada de verdadeiramente novo, produzirá apenas uma moral demasiado medíocre.