A trilha sonora de um filme é um particular capítulo do encantamento cinematográfico. Sou um leitor de letras de música. Encartes de CD são material para leitura. Lê-los possibilita um mergulho mais profundo na audição musical. Alguns textos apresentam densidade poética. Dentre as músicas tocadas em AQUARIUS, obra cinematográfica de Kleber Mendonça Filho, destaco a pérola sonora “Um Jeito Estúpido de te Amar” (Isolda/ Milton Carlos), registro vocal de Maria Bethânia, gravado por ela em 1977 no belo LP “Pássaro da Manhã”. Clara, a personagem principal da narrativa fílmica, interpretada por Sonia Braga, está dentro de um carro, na companhia do seu sobrinho e ela sugere que ele coloque Maria Bethânia para a garota com a qual ele terá um encontro. “Mostre para ela que tu é intenso”. Em um diálogo intergeracional, eles trocam experiências musicais. A visceralidade do canto da “abelha-rainha” da Música Popular Brasileira é sinônimo de intensidade. A citada canção é uma prova do denso repertório de uma das nossas maiores intérpretes. Atentemos para a intensa mensagem do texto cantado:

Eu sei que eu tenho um jeito

Meio estúpido de ser

E de dizer coisas que podem

Magoar e te ofender

Mas cada um tem o seu jeito

Todo próprio de amar e de se defender

Você me acusa e só me preocupa

Agrava mais e mais a minha culpa

Eu faço e desfaço, contrafeito

O meu defeito é te amar demais

Palavras são palavras

E a gente nem percebe o que

Disse sem querer

E o que deixou pra depois

Mas o importante é perceber

Que a nossa vida em comum

Depende só e unicamente de nós dois

Eu tento achar um jeito de explicar

Você bem que podia me aceitar

Eu sei que eu tenho um jeito

Meio estúpido de ser

Mas é assim que eu sei te amar