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PPGS020 - SEXUALIDADE, IDENTIDADES E SUBJETIVIDADES - Turma: 01 (2019.1)

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  • MÃES TROPICALISTAS
  • 11/05/2019 23:59
  • Texto:

    Gilberto Gil, Capinan, Caetano Veloso, Os Mutantes, Nara Leão, Gal Costa, Tom Zé, Torquato Neto, Rogério Duprat. Nomes expressivos da cultura do Brasil e responsáveis pela produção artística de um dos mais importantes discos da grande discoteca brasileira. TROPICÁLIA OU PANIS ET CIRCENCIS é o título da mencionada obra musical. Um marco sonoro histórico, conceitual e desafinador do “coro dos contentes”. Barulhinho bom, provocativo e encantador tal qual a angelical imagem sonora de um “anjo louco e torto”. D(i)scoberta que atravessa gerações e continua potente na sua força inspiradora. Pérola pescada para ancorar mais um encontro da disciplina “Música Popular Brasileira e Encontro de Gerações”, ministrada no Programa Terceira Idade em Ação (PTIA), projeto extensionista da Universidade Federal do Piauí. As dores e as delícias de ser mãe foi o tema proposto para reflexão no dia 30 de abril de 2019. A fonte musical foi o citado LP tropicalista, gravado em uma significativa data: maio de 1968. Desafinação fonográfica em um contexto ditatorial brasileiro. Sociólogos e historiadores, através da música, ouvem cantos que trilham a história do Brasil. Da política aos nossos amores, o verbo ouvir é conjugado por quem escuta as bossas e batidas dos nossos brasis e com elas é levado a uma particular forma de narrar o processo histórico brasileiro. André Diniz e Diogo Cunha dão o toque para que trilhemos as ondas do Brasil cantado do choro ao funk.

    No mês dedicado às mães, extraímos uma dupla de canções, a elas direcionadas, no memorável álbum. Concebidas por compositores de diferentes matrizes geracionais, as duas músicas, na diversidade tonal que apresentam, expressam as emoções e os sentimentos que mediam as maternas ações afetivas. Diversas em dramaticidade, narram os múltiplos ais das Salomés e Canôs, nomes plurais e representativos das experiências de concepções filiais. Mulheres na maternidade gozosa e dolorosa. No  “limiar da vida”, elas subjetivam visões sobre os sentidos do ser ou não ser mãe. Subjetivações captadas pelas densas lentes bergmanianas. Corações maternos pulsam nas cores do cinema de Almodóvar e Gilda de Abreu. Pulsações cardíacas sonorizadas com o “Obrigado Mãe”, de Agnaldo Timóteo. Mamãe, mãezinha ou Mamma na masculina vocalização do canto popular. De “Nossa Senhora” ao “fogão de lenha”, o sentimental cantor agradece à “flor”, “um pedaço do céu” contido em três letras da “palavra mais linda”. Canções vocalizadas pelo filho artista, grato a “ela”, sua “heroína”, a “dona de tudo”, a “rainha do lar”. Gratidão cantada em dueto com Angela Maria.

    Músicas, na ótica de Silvana Goellner, são “locais pedagógicos”. A audição musical começou com “Coração Materno”, drama lacrimejante de Vicente Celestino. No LP TROPICÁLIA OU PANIS ET CIRCENCIS, Caetano Veloso faz a sua releitura da melodramática composição celestina. Na referida aula, escutamos na operística voz de Vicente Celestino. Na sequência, ouvimos “MAMÃE, CORAGEM”, parceria de Caetano Veloso com Torquato Neto. No disco TROPICÁLIA, Gal Costa é a sua intérprete. Na nossa lúdica e pedagógica reunião, curtimos no registro vocal de Nara Leão. Na trilha das construções dos relacionamentos maternos, o acesso à ambígua humanidade dos mesmos, com as suas ambivalências e paradoxos, é feito pela via da imaginação criativa dos músicos sintonizados com a nobreza e a vilania dos seres humanos. As mães são feitas da carne que irmana todos os mortais. São geradoras de lucidez e equívocos. Humanas demais nos seus amorosos cuidados. Adoráveis e sufocantes em seus exageros. Todos (as) nós somos assim. Caso contrário, negaríamos os limites marcadores da nossa espécie carnal. Ligações amorosas, nas suas diversidades, são rebentos de construções sociais. Não são naturais e nem nascem prontas e acabadas. Resultam de investimentos afetivos. Numa palavra, trabalho. Paridores de sons, os tropicalistas cantam as uterinas mulheres, as diversas genitoras das quais são o rebento. Exalto a palavra concepção. Revivendo as radiolas, seguem as letras que tocaram no aparelho de CD usado na reflexiva conversa, embalada por notas musicais:

    CORAÇÃO MATERNO (VICENTE CELESTINO)

    DISSE UM CAMPÔNIO À SUA AMADA:

    ”MINHA IDOLATRADA, DIGA O QUE QUER

    POR TI, VOU MATAR, VOU ROUBAR

    EMBORA TRISTEZAS ME CAUSES, MULHER

    PROVAR QUERO EU QUE TE QUERO

    VENERO TEUS OLHOS, TEU PORTE, TEU SER

    MAS DIGA, TUA ORDEM ESPERO

    POR TI NÃO ME IMPORTA MATAR OU MORRER”

     

    E ELA DISSE AO CAMPÔNIO, A BRINCAR:

    “SE É VERDADE TUA LOUCA PAIXÃO

    PARTE JÁ, E PRA MIM VAI BUSCAR

    DE TUA MÃE INTEIRO O CORAÇÃO”

    E A CORRER O CAMPÔNIO PARTIU

    COMO UM RAIO NA ESTRADA SUMIU

    SUA AMADA QUAL LOUCA FICOU

    A CHORAR, NA ESTRADA TOMBOU

     

    CHEGA À CHOUPANA O CAMPÔNIO

    ENCONTRA A MÃEZINHA AJOELHADA A REZAR

    RASGA-LHE O PEITO O DEMÔNIO

    TOMBANDO A VELHINHA AOS PÉS DO ALTAR

    TIRA DO PEITO SANGRANDO

    DA VELHA MÃEZINHA, O POBRE CORAÇÃO

    E VOLTA A CORRER, PROCLAMANDO:

    VITÓRIA, VITÓRIA TEM MINHA PAIXÃO

     

    MAS EM MEIO DA ESTRADA CAIU

    E NA QUEDA UMA PERNA PARTIU

    E À DISTÂNCIA SALTOU-LHE DA MÃO

    SOBRE A TERRA O POBRE CORAÇÃO

    NESSE INSTANTE UMA VOZ ECOOU:

    “MAGOOU-SE, POBRE FILHO MEU?

    VEM BUSCAR-ME, FILHO, AQUI ESTOU

    VEM BUSCAR-ME, QUE AINDA SOU TEU”

     

    MAMÃE, CORAGEM (CAETANO VELOSO/TORQUATO NETO)

    MAMÃE, MAMÃE, NÃO CHORE

    A VIDA É ASSIM MESMO

    EU FUI EMBORA

    MAMÃE, MAMÃE, NÃO CHORE

    EU NUNCA MAIS VOU VOLTAR POR AÍ

    MAMÃE, MAMÃE, NÃO CHORE

    A VIDA É ASSIM MESMO

    EU QUERO MESMO É ISTO AQUI

     

    MAMÃE, MAMÃE, NÃO CHORE

    PEGUE UNS PANOS PRA LAVAR

    LEIA UM ROMANCE

    VEJA AS CONTAS DO MERCADO

     

    PAGUE AS PRESTAÇÕES

    SER MÃE

    É DESDOBRAR FIBRA POR FIBRA

    OS CORAÇÕES DOS FILHOS

    SEJA FELIZ

    SEJA FELIZ

     

    MAMÃE, MAMÃE, NÃO CHORE

    EU QUERO, EU POSSO, EU QUIS, EU FIZ

    MAMÃE, SEJA FELIZ

    MAMÃE, MAMÃE, NÃO CHORE

    NÃO CHORE NUNCA MAIS, NÃO ADIANTA

    EU TENHO UM BEIJO PRESO NA GARGANTA

     

    EU TENHO UM JEITO DE QUEM NÃO SE ESPANTA

    (BRAÇO DE OURO VALE 10 MILHÕES)

    EU TENHO CORAÇÕES FORA PEITO

    MAMÃE, NÃO CHORE

    NÃO TEM JEITO

    PEGUE UNS PANOS PRA LAVAR

    LEIA UM ROMANCE

    LEIA “ALZIRA MORTA VIRGEM”

    “O GRANDE INDUSTRIAL”

     

    EU TANDO AQUI VOU INDO MUITO BEM

    DE VEZ EM QUANDO BRINCO CARNAVAL

     

    E VOU VIVENDO ASSIM: FELICIDADE

    NA CIDADE QUE EU PLANTEI PRA MIM

    E QUE NÃO TEM MAIS FIM

    NÃO TEM MAIS FIM

    NÃO TEM MAIS FIM



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