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PPGS003 - SEMINÁRIO DE PROJETO - Turma: 04 (2019.2)

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  • DER LETZTE MANN PARA O COMPLÔ DOS MATUSALÉNS
  • 23/10/2019 10:07
  • Texto:

    TELA SOCIOLÓGICA: A ÚLTIMA GARGALHADA. SESSÃO EXIBIDA EM 18/10/2019. 16 HORAS. SALA DE VÍDEO II (CCHL/UFPI). “Hoje, você é o primeiro, respeitado por todos, um ministro a um general, talvez até um príncipe. Você sabe o que será amanhã?” Pergunta que abre o filme A ÚLTIMA GARGALHADA, dirigido por Friedrich Wilhelm Murnau. Obra de 1924, é uma representativa criação do expressionismo alemão. Cinema mudo na sua expressividade comunicativa. Um texto fílmico a ser indicado para quem trabalha com o tema do envelhecimento humano. Os anos passaram e as mensagens que veicula continuam contundentes. A lógica utilitária que valoriza a quem é produtivo e jovem, recebe tratamento cinematográfico. A tela vai a um contexto histórico onde a longevidade da população mundial não ganhava a visibilidade dos dias de hoje. O protagonista de A ÚLTIMA GARGALHADA é um idoso que trabalha na recepção do “Atlantic Hotel”, estabelecimento de muitas estrelas no tocante ao seu prestígio. Ser seu funcionário e vestir a sua farda, elevava o status social do trabalhador da prestigiada empresa hoteleira. A vestimenta simbolizava o destaque empresarial no local em que estava situado. Uniforme de distinção e respeitabilidade para os seus funcionários. Em uma faixa etária avançada, o nosso personagem principal recebe um documento com o seguinte conteúdo: “Tendo em vista seus muitos anos de serviço conosco, arrumamos uma outra posição para você. O deslocaremos, a partir de hoje, a um centro de assistência de limpeza. A razão dessa medida é a sua alta idade”. Justificativa desconcertante, geradora de abalo emocional. Ele já não aguentava carregar as pesadas malas dos hóspedes. Bagagens com alças, sem a praticidade das de rodinhas dos dias atuais. Da entrada do chique prédio para o interior de uma toalete, assistimos os desdobramentos subjetivos de dor sentidos por quem foi rebaixado por causa da sua altitude etária. Envergonhado, esconde da própria família a mudança na sua atividade profissional. E se os seus bisbilhoteiros e fofoqueiros vizinhos souberem da lamentável novidade? Ririam do seu infortúnio? E o fato de não mais poder circular com o respeitável uniforme de trabalho? Angustiantes perguntas a desassossegar um velho despojado de uma honrosa posição.

    Da porta principal para o recinto onde ajudava os hóspedes a enxugarem as suas mãos. O figurino agora é outro. Com a mudança de atividade, a nova vestimenta não mais simboliza prestígio. Alterações que abalam a trajetória de um homem que envelhece trabalhando. Um sujeito que já não está na frente, pois foi transferido para uma posição periférica. Imagens de um homem caindo, abatido pelo abalo profissional experimentado. Velhice em decadência, distando de ser bela. Lógica societária que descarta pessoas consideradas improdutivas. A narrativa fílmica dramatiza uma situação histórica que vai colocando de escanteio quem está perdendo as suas forças juvenis. O valor de alguém é dado em função das suas capacidades produtivas. Contexto no qual envelhecer é um verbo de difícil conjugação. Pensando em termos de velhices, são diversas as suas experiências. Nas telas são expostas as visões construídas por cineastas que focalizam as perdas e ganhos de quem está envelhecendo. “Divertidos e filosóficos”, os pensantes conteúdos cinematográficos provocam impacto emocional e constituem “uma dimensão compreensiva do mundo”. Julio Cabrera promove “uma introdução à filosofia através dos filmes”. Na “dramatização habitual das ideias”, o cinema de A ÚLTIMA GARGALHADA explicita, de modo mais claro, os “conceitos-imagem do despojo ou da queda”. Esclarecimento, liberação, cognição, persuasão e argumentação formam conjunto de palavras-chave quando filosofamos a partir de leituras fílmicas.

    Murnau é expressivo no realismo com o qual pinta uma velhice multicor. O velho humilhado da sua projeção telânica recebe uma recompensa da cuidadosa atenção do seu criador artístico. São várias as viradas existenciais que experimenta. Da situação de abandono e adversidades nas quais foi posto, ele ganha um the end extraordinário. Um final no qual aponta para uma faceta não luminosa, ou seja, a dos seres humanos interesseiros que valorizam os que são detentores de bens materiais, os possuidores. Em uma sociedade camarotizada, os poderosos são os proprietários do capital. Em camarotes vips, são bajulados pelos que querem tirar vantagens pessoais das suas riquezas e fortunas. Em bíblica evocação, Murnau desmascara a nossa controvertida humanidade. A dor do velho protagonista alimenta as risadas dos seus vizinhos. O tratamento a ele dispensado mudou após o seu deslocamento no trabalho que realizava. Em humilhante posição, de cabeça baixa, ele e os seus espectadores são surpreendidos pela criativa decisão de um singular cuidador: “Aqui, nessa posição de humilhação, o velho homem passaria o resto de sua vida miseravelmente e aqui a história terminaria. Contudo, o autor está cuidando dele, que foi abandonado por todos. Então criou um epílogo contando uma história que ...infelizmente não ocorre com frequência na vida real”.

    Na guinada finalizadora de A ÚLTIMA GARGALHADA, foi criado um surpreendente desfecho para premiar a quem provou das humilhações impostas por ter envelhecido. Em noticiário jornalístico, o registro de um afortunado que herdou um rico patrimônio deixado por quem esteve sob os seus cuidados quando estava morrendo: “Uma herança sensacional. Ficará na memória que o Sr. A. G. Monen, o famoso bacharel milionário, morreu subitamente no hotel Atlantic. Em seu testamento dizia que sua fortuna pertenceria à pessoa que o tivesse em seus braços no momento de sua morte. Portanto, o provérbio bíblico: “os últimos serão os primeiros” parece já ter sido realizado na terra, e o sortudo é...”. Em bíblica evocação literária, recorro a Machado de Assis quando alude ao “divino sermão da montanha”. No encerramento do seu conto “O Enfermeiro”, “emenda” sagrada citação evangélica: “Bem-aventurados os que possuem, porque eles serão consolados”.



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