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PPGS013 - TEORIA SOCIOLÓGICA I - Turma: 01 (2020.1)

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  • MARIGHELLA NO WHATSAPP DA TEORIA SOCIOLÓGICA
  • 19/08/2020 23:00
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    Nas trilhas da trajetória histórica de Carlos Marighella, os Racionais MC's cantam um dos "clássicos do Rap nacional". Canção composta por Mano Brown em agradecimento a Marighella, referência política aplaudida e exaltada pelo citado grupo musical. Em as MIL FACES DE UM HOMEM LEAL, o som politizado da juventude periférica realça qualidades do guerrilheiro socialista. Uma figura messiânica, revolucionária, ousada, honrada, leal, multifacetada e nome símbolo da revolução em todos os brasis. Ouvimos o conteúdo de um trabalho sonoro a trilhar a história de vida de um ser humano dono de uma travessia digna de projeção cinematográfica. Nos vocais do texto cantado, a participação especial de um eloquente personagem da vida pública brasileira: MARIGHELLA.

     "...É um dos heróis do povo brasileiro. É um santo do socialismo. Um santo ateu. Um santo sem Deus". Palavras proferidas por Antonio Candido Mello e Souza (crítico literário e ex-militante do Partido Socialista Brasileiro) sobre Carlos Marighella, o "inimigo número 1 da ditadura militar". Na tela, vemos um documento histórico sobre uma das mais expressivas figuras da política brasileira do século XX. Um sujeito da resistência armada, protagonista atuante nos "subterrâneos da liberdade". Personagem do romance de Jorge Amado em uma trajetória de luta guerrilheira. Caçado como um terrorista procurado por assalto, roubo e morte, Marighella foi homem disposto a sacrificar a sua própria vida em nome dos princípios que orientavam as suas táticas políticas. "Arme-se e liberte-se", "a ação faz a vanguarda". Escritos revolucionários e manual do guerrilheiro a orientar o valente "chefe comunista". Imagens narram a história de engajamento político do mulato baiano que, na sua experiência de clandestinidade foi, aos olhos do poder, "a caça mais cobiçada". MARIGHELLA, o filme de Isa Grinspum Ferraz segue as pistas de um anjo torto e desafinado em relação ao coro dos contentes. Preso e torturado, ele foi assassinado pelos inimigos da democracia e agentes do autoritarismo e seus "cálices".

     “Por que o pobre trabalha toda a vida e nunca tem nada?” Esta pergunta ocupava as meditações de Carlos Marighella desde os tempos de criança. São as pistas da trajetória histórica de um líder revolucionário percorridas pelas lentes cinematográficas de Isa Grinspum Ferraz. Em MARIGHELLA, ela documenta a militância de um comunista que, na definição do historiador Lincoln Secco, é aquele capaz de “doar a vida por uma causa”. Em um trabalho memorialístico, Isa reconstrói a caminhada daquele que é apresentado pelo também historiador, Jacob Gorender, como “um dos homens mais valentes que eu conheci em minha vida”. Consideração fundamentada por imagens de arquivo e depoimentos de ex-militantes do Partido Comunista Brasileiro (PCB) e da Aliança Libertadora Nacional (ALN). Marighella, o “poeta guerrilheiro”, em texto de 1968, encarando a ditadura militar brasileira, expõe planos para tornar o Brasil um país justo e com independência em relação ao imperialismo gerador de dependência entre os países centrais e periféricos do capitalismo. Na sua guerrilha verbal, dispara palavras de libertação: “Com a vitória da revolução, executaremos as seguintes medidas populares: Aboliremos os privilégios e a censura. Estabeleceremos a liberdade de criação e a liberdade religiosa. Libertaremos todos os presos políticos e eliminaremos a polícia política. Tornaremos efetivo o monopólio estatal das finanças, do comércio exterior, das riquezas minerais e dos serviços fundamentais. Confiscaremos a propriedade latifundiária garantindo títulos de propriedade aos agricultores que trabalhem a terra. Eliminaremos a corrupção. Serão garantidos empregos a todos os trabalhadores, homens e mulheres. Reformaremos todo o sistema de educação. Daremos expansão à pesquisa científica. Retiraremos o Brasil da condição de satélite da política exterior norte-americana para que sejamos independentes”.

     "Marighella é a expressão mulata, bonita, do comunismo baiano da década de 30". "Meninos seduzidos pela utopia comunista". Dentre eles, Jorge Amado. Palavras proferidas pelo antropólogo e poeta Antônio Risério. Comunistas eram alvos da polícia política. Repressão e cadeia para os "cavalheiros afetados de comunismo". Em nome de uma "boa profilaxia social", os "chefes vermelhos" eram reprimidos e presos. Aulas de história do Brasil nas imagens documentais de MARIGHELLA, filme de Isa Grinspum Ferraz. Do "abaixo o integralismo!" à "caça mais cobiçada" do regime ditatorial brasileiro dos anos 60, Carlos Marighella é retratado como o militante guerrilheiro das lutas libertárias. Homem revoltado com as desigualdades e injustiças sociais. Na sociedade da decepção, uma referência para as esquerdas do campo da política. Puxou gatilho e "teorizava a luta revolucionária", segundo o depoimento de Aton Fon Filho (advogado, ex-militante do PCB e da ALN). Preso, torturado e clandestino. Entrega total à causa que defendia. Marighella está espelhado na definição de Jean-Luc Godard: "Deixem-me dizer sob pena de parecer ridículo que o revolucionário verdadeiro é guiado por grandes sentimentos de amor". Entre erros e acertos, Marighella é nome destacado da vida pública brasileira. Convicto e responsável, do ponto de vista ético, Marighella, na sua farta humanidade, "foi um dos melhores quadros políticos do Brasil do século XX. Foi uma vida densa como poucos brasileiros tiveram". Densidade reconhecida por José Luis Del Roio (Jornalista, ex-militante do PCB e da ALN). No sacrifício altruísta da sua  própria vida, Marighella revelou ser seguidor de um princípio propagado por Che Guevara: "El deber de todo revolucionario es hacer la revolución".

     A densa vida de Carlos Marighella encerra um farto conteúdo para produções cinematográficas. Isa Grinspum Ferraz, socióloga e sobrinha do guerrilheiro revolucionário, documentou o homem por trás do mito de uma geração. Uma existência de luta e ousadia para ser filmada por lentes politizadas e interessadas na valorização dos nossos patrimônios humanos. Um trabalho de pesquisa histórica das memórias de gente referência na história política brasileira. Para as novas gerações, é ter acesso às imagens de um militante modelar no modo umbilical como assumia as bandeiras que defendia. Símbolo de resistência, Marighella chamou a atenção do ator/diretor Wagner Moura. Com a sua assinatura, outra vez temos a oportunidade de assistir mais uma leitura fílmica sobre o focalizado líder comunista. Narrativas fílmicas com potencial para cenas explosivas, vibrantes, emocionantes e que cheguem a provocar a sensação de termos recebido um soco no estômago. Drama e suspense para narrar a trajetória do resistente Marighella. No trailer do filme dirigido por Wagner Moura, a voz do personagem protagonista realça o verbo resistir. Resistência discursiva em tela. Luta armada com tiros verbais: "Escutem bem o que eu vou dizer. Se algum de vocês quiser ir embora, a hora é agora. A única coisa que eu consigo prometer hoje é tortura e morte. Mas eu vou dizer uma coisa. Nós vamos revidar com toda a força o que aconteceu hoje. É importante eles saberem que a gente não vai parar. A gente não vai parar. As pessoas precisam saber que no Brasil tem gente resistindo e que essa luta é justa".

     Carlos Marighella multidimensional: "Crítico de futebol em Copacabana". "Fã de cantadores de feira" e "grande apreciador de batidas de limão". Outras facetas do "guerrilheiro" e "assaltante de bancos" procurado pela polícia. Imagens divulgadas na década de 60, quando ele chegou a ser capa de uma das edições da revista “Veja”. O ser apaixonado pela política e a sua relação amorosa com Clara Charf (ex-militante do PCB e da ALN). Companheira de Marighella, enfrentou os preconceitos do seu pai que não queria vê-la casada com um "negro e comunista". Clara acompanhou o amante em sua existência perigosa e clandestina. Na clandestinidade, com peruca e o nome de "Vera", a "comunista perigosa" experimentou a prisão. A sua voz tem uma presença marcante no filme MARIGHELLA, de Isa Grinspum Ferraz. Nesta narrativa, outras facetas do homem Marighella são expostas. O lado afetivo, emocional e sentimental da criatura sedutora que tinha "xurupito", ou seja, despertava tesão. Traços humanos do político de vida pública. Um ser poético ficava em segundo plano diante da imagem do militante revolucionário. Privacidade e intimidade na história de um combatente ocupado com as questões coletivas, mas que tinha as suas experiências privadas. Em tela, um sujeito histórico. Deputado, companheiro, pai, amigo, guerrilheiro, comunista, brasileiro, baiano, negro. Gente da raça Brasil. Nome presente nos livros da história narrada pelos dominados. "Retiro da maldição e do silêncio o seu nome de baiano: Carlos Marighella". E assim escreveu Jorge Amado.

     A herança do pensamento de Marx marca presença na era da turbulência em que vivemos. Progressos e regressões. Turismo na lua e a persistência da fome. Garçons robôs e os moradores de rua. Terrores variados, em especial os horrores econômicos. Ambivalências da globalização. Sociedade em redes, de riscos e dos consumidores. Conflitos e lutas de classes fazem parte dos espetáculos midiáticos do cotidiano. Criminalização da pobreza. Apartações sociais. Gente invisível. Estas e outras cenas cotidianas não deixam dúvida sobre a atualidade da visão de Marx sobre o capitalismo. Fui ao cinema reencontrar um sujeito histórico evocativo das ideias de Karl Marx: Carlos Marighella. Um comunista guerrilheiro, poético. Em 1939, de um presídio em São Paulo, escreveu "Liberdade", poema das suas memórias do cárcere. Combatente, levantava bandeiras com as armas dos fuzis e da crítica. "Minha disposição é lutar revolucionariamente junto com as massas". Militante estrategista que "lia como um doido". Aventura política fundamentada com formação teórica. E segue uma relação de escritos revolucionários de Marighella: Manual do Guerrilheiro Urbano; Por Que Resisti à Prisão; Luta Interna e Dialética; La Guerrilla em Brasil; La Guerra Revolucionaria; Teoria Y Revolucionarias; Pour La Libération du Brésil; For The Liberation of Brasil. Na companhia das letras, uma lição: Engajamento político não é coisa para aventureiro. Militante necessita de fundamentos teóricos para qualificar as ações "da guerra revolucionária". "É preciso um fuzil para ser um revolucionário". Frase emitida no filme MARIGHELLA, de Isa Grinspum Ferraz. Balas com leituras textuais para a elaboração das estratégias e táticas políticas. Em texto e imagem, os gritos populares: "Pelo Brasil Comunista!"; "Pela Revolução Internacional!"; "Abaixo às Guerras Imperialistas!"; "Chega de Exploração!". Sem modelos cubanos, soviéticos e chineses, a revolução brasileira, em conformidade com o projeto de Marighella, apresentaria um "colorido moreno", "com samba, futebol". E ele conclui o seu toque cultural: "Saudações Comunistas!".

     

     

     

     

     

     

     

     

     

     

     

     

     

     

     

     

     

     

     



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