A hanseníase, causada pelo Mycobacterium leprae, ainda representa um desafio crítico de saúde pública, sobretudo em países em desenvolvimento como o Brasil. Apesar da eficácia da poliquimioterapia (PQT) atualmente recomendada, que inclui dapsona, rifampicina e clofazimina, limitações como efeitos adversos, baixa adesão ao tratamento, resistência medicamentosa e ausência de medidas preventivas altamente eficazes indicam a urgência no desenvolvimento de novas estratégias terapêuticas e vacinais. Neste contexto, uma abordagem biotecnológica dual com o desenvolvimento in silico de uma vacina multiepitópica contra M. leprae e a formulação de nanopartículas poliméricas utilizando goma do cajueiro modificada para encapsulamento da dapsona surge como uma proposta integrada capaz de atuar tanto na prevenção quanto no tratamento da hanseníase, oferecendo soluções complementares para os desafios terapêuticos e imunológicos que a doença impõe. Na primeira etapa do estudo, foram utilizadas ferramentas de imunoinformática para o desenho racional de uma vacina multiepitópica baseada na triagem e predição de epítopos B e T derivados de proteínas de membrana do M. leprae. Após a triagem de 1426 proteínas de membrana, quatro proteínas antigênicas e não alergênicas foram selecionadas. A partir delas, foram preditos e refinados epítopos para os complexos MHC classe I (CTL), MHC classe II (HTL) e células B, utilizando plataformas como IEDB, VaxiJen, AllerTOP, ToxinPred e IFNepitope. Os 11 epítopos selecionados foram organizados em uma construção quimérica com linkers específicos (AAY, GPGPG e KK) e adjuvante HBHA conectado via EAAAK, totalizando uma proteína de 386 aminoácidos. Avaliações in silico indicaram alta antigenicidade (score VaxiJen = 0,8478), ausência de alergenicidade e toxicidade, estabilidade estrutural e ausência de similaridade com proteínas humanas. Esses dados sustentam o potencial da construção como candidato vacinal seguro e eficaz. Paralelamente, foi desenvolvida uma segunda linha experimental visando contornar as limitações farmacocinéticas da dapsona. A proposta baseou-se na formulação de sistemas nanoestruturados utilizando como matriz a goma do cajueiro, um polissacarídeo natural extraído do Anacardium occidentale L. A goma foi modificada por acetilação introduzindo grupos acetil a partir do anidrido acético, resultando em um derivado (GCA) com propriedades aprimoradas de solubilidade e compatibilidade para aplicação em liberação controlada. A modificação foi confirmada por espectroscopia no infravermelho (FTIR) e Ressonância Magnética Nuclear (RMN). As nanopartículas formuladas foram caracterizadas quanto ao seu perfil físico-químico por meio da análise de potencial zeta, tamanho médio e índice de polidispersividade (PDI), parâmetros fundamentais para avaliar a estabilidade coloidal, uniformidade e distribuição de tamanho das partículas no sistema. Dessa forma, os resultados parciais deste trabalho demonstram o potencial sinérgico entre a predição racional de vacinas e o uso de nanotecnologia com biomateriais naturais na busca por soluções inovadoras e sustentáveis contra a hanseníase. A integração dessas abordagens poderá contribuir significativamente para a superação de obstáculos terapêuticos e profiláticos, promovendo avanços no combate a essa doença negligenciada.