A presente pesquisa propõe uma análise de alguns dos processos de crioulização, conforme Édouard Glissant (2014, 2011, 2005, 1997a, 1997b), perscrutados no romance Um defeito de cor (2009 [2006]) de Ana Maria Gonçalves. Levantamos a hipótese de que através de uma leitura glissantiana do romance Um defeito de cor podemos experimentar uma nova maneira, entre outras possíveis, de perceber os sentidos de nossa coletividade. A busca dos instrumentos teóricos e procedimentos metodológicos que subsidiam este estudo parte da apropriação das seguintes premissas desenvolvidas por Glissant (2005 [1996]): i) o Caribe tomado como prefácio às Américas, de modo a considerar Um defeito de cor como uma obra literária habilitada a operar como um prefácio às literaturas americanas, nos termos ora enunciados, visando a uma discussão das condições de possibilidade à identidade cultural latino-americana sob perspectiva assumida a partir da leitura do romance e mediante a um conjunto mais amplo das literaturas afro-americanas; e ii) a identidade-rizoma, de modo a compreender o romance como integrante do entrecruzamento de valores da totalidade-mundo. A voz memorialística de Kehinde/Luísa, protagonista-narradora do romance em questão, rasura a ordem gnoseológica dominante – que respalda processos de exclusão dos grupos marcados pela diferença colonial (MIGNOLO, 2003) – orientando uma compreensão de identidade cultural latino-americana enquanto tributária das Relações entre as coletividades aqui inscritas. Concluímos que a leitura glissantiana da obra Um defeito de cor colabora com o desenvolvimento de práticas descolonizadas na construção do conhecimento. Ademais, ressaltamos a necessidade de marcar uma epistemologia desde a diferença cultural frente a um padrão de conhecimento geohistoricamente situado que se impõe como universal.