O livro de Samuel Beckett (1906-1989), Textos para nada, faz parte da segunda fase da prosa do autor, quando optou pela escrita em língua francesa. Publicados em 1955, os treze fragmentos foram escritos durante o pós-guerra, momento em que a sociedade tentava se reerguer, dados os acontecimentos anteriores ocasionados pela Segunda Guerra Mundial. Mas como expressar essa devastação? Beckett dizia que a linguagem era incapaz de comunicar o caos, por isso ele tentava de todas as formas perfurá-la, percorrer o seu fora da maneira mais labiríntica possível (BLANCHOT, 2013). Conforme Deleuze (1997), toda obra é uma viagem, que realiza tal ou qual trajeto em virtude dos caminhos interiores que a compõem. Em Textos para nada os percursos interiores da obra delineiam um horizonte de silêncios eloquentes, que falam no intuito de nada significar. É o que a retórica do silêncio, segundo Sontag (2015), indica, já que o artista não pode literalmente exercer o silêncio e permanecer um artista, deve-se então perseguir suas atividades de forma mais errática que antes. O narrador beckettiano não possui nem voz própria, nem corpo, não consegue nem calar nem criar histórias; ele está preso ali, num limbo, seguindo sua travessia silenciosa e esgotando todas as possibilidades combinatórias da linguagem (DELEUZE, 2010). A narrativa prossegue comandada por vozes que tentam, de alguma forma, criar um narrador para si. Os fluxos de pensamento desse possível narrador que, ao que parece, é manipulado como um boneco de ventríloquo, esboçam o movimento pelo qual o literato enquanto artista experiencia. Segundo Blanchot (2011), a obra de arte não pode ser projetada, apenas realizada. Mas para que a obra seja realizada é necessário que o autor se torne ausente e, nesse impasse, aquele que escreve já não é Beckett, mas outro. Os outros outros estão sempre presentes na obra beckettiana, são sempre os outros que falam, são eles, os outros, que criam as histórias: “Mas o outro que é eu, cego, surdo e mudo, por causa de quem não posso mais me mexer nem acreditar ser minha esta voz”. (BECKETT, 2015). A pesquisa aqui evidenciada propõe uma leitura acerca dos silêncios que compõem os fragmentos de Textos para nada, a saber: como esses silêncios que falam eloquentemente compõem uma escrita nula, débil e eficaz? Como essa escrita nula constitui uma experiência do fora? Para alcançar tais reflexões faz-se necessário buscar teorias e conceitos fora dos tapumes da Teoria Literária.