Nessa dissertação, proponho uma análise enunciativa do romance Humus (2006), da escritora martinicana Fabienne Kanor, à luz dos estudos enunciativos de Émile Benveniste e da escrevivência, enquanto operador teórico forjado por Conceição Evaristo. Considerando o pressuposto benvenistiano de que é na e pela linguagem que o homem se constitui como sujeito, investigo como a narrativa de Kanor, que retrata o trauma da escravidão transatlântica através das vozes de mulheres africanas que escolhem o suicídio coletivo como forma de insurgência, funciona como um ato enunciativo que resgata e humaniza essas subjetividades historicamente silenciadas. Dito isso, o problema de pesquisa pelo qual me guio, reside em compreender de que maneira a escrevivência pode servir como base teórico-metodológica para as variáveis enunciativas das marcas de intersubjetividade e subjetividade, que configure um aparelho formal de enunciação escrita. Minha hipótese é que a literatura de autoria feminina negra amefricana, regidas pela escrevivência, sugere uma poética de expressão que subverte a lógica dominante e promove um agenciamento coletivo de enunciação. Para chegar a uma resposta que satisfaça essa hipótese, busco identificar e analisar as estratégias narrativas em Humus que revelam essas marcas, apontando como essa escrita promove a construção de novas formas de existência e reconhecimento dessas vozes marginalizadas. Ao explorar a intersecção entre linguagem e literatura, busco ampliar os entendimentos sobre a função humanizadora da escrita e sua capacidade de contestar e transformar estruturas sociais e epistemológicas de opressão. Metodologicamente, apoio- e em uma revisão bibliográfica abrangente, envolvendo o arcabouço teórico de Émile Benveniste (Problemas de Linguística Geral I e II) e de estudiosos privilegiados de sua obra, como: Flores (2009; 2013; 2018; 2019; 2022; 2023; 2024), Rabatel (2016), Fiorin (2016) e Dessons (2006; 2020), além de contribuições de teóricos como Achille Mbembe (2020; 2022), Homi K. Bhabha (2013), Gayatri Spivak (2021), Stuart Hall (2016) e outros que dialogam com questões pós-coloniais e de representação sociocultural. A análise literária de Humus será alicerçado sobre os princípios dos estudos enunciativos, considerando também os aportes teóricos sobre escrevivência fornecidos por Evaristo (2020) e aprofundados pelas teóricas Lívia Natália de Souza (2018; 2020), Assunção de Sousa Silva (2020) e Rosane Borges (2020), além de estudos da Narratologia, conduzidos por Reuter (1996). Com os resultados dessa pesquisa, espero evidenciar como a escrita de Kanor incorpora e potencializa a escrevivência, sob uma perspectiva enunciativa, como uma poética de expressão a outras autoras negras, configurando-se como um parâmetro de enunciação escrita. Com isso, almejo contribuir com o avanço de novas abordagens que integrem os estudos linguísticos e literários, revelando a importância da linguagem como instrumento fundante da condição humana.