Com o objetivo de abordar as interpretações da realidade por parte dos intelectuais piauienses a partir de um novo viés, o presente trabalho questiona o lugar da raça na formação desses intelectuais e na construção das leituras de mundo pela cultura letrada, no período que compreende o fim do século XIX e o início do século XX. Partindo da criação e da popularização de teorias raciais nos oitocentos, analisa-se a maneira pela qual as diferenças físicas, climáticas e geográficas – tendo como base o padrão europeu e norteamericano – tornaram-se objeto de estudo das ciências, as quais utilizavam uma abordagem fortemente tributária das ciências naturais. Nesse sentido, a teoria da evolução das espécies tornou-se central para o discurso cientificista que rapidamente foi apropriado por inúmeras pseudociências de cunho racista, as quais obtiveram grande prestígio, inclusive no Brasil. Nesse contexto, o discurso racial servia como instrumento de interpretação social e era usado como justificativa para as desigualdades entre grupos, transformando-se num debate que atravessava o ambiente acadêmico e as páginas dos jornais. Seja através de teóricos consagrados ou da vulgarização científica, os sujeitos racializados tornavam-se alvo de análises, ataques e piadas, contribuindo significativamente para a estigmatização de grupos, especialmente os negros. Nesse universo racista, a racialização de sujeitos era utilizada como arma de difamação e inferiorização, inclusive entre membros da elite piauiense, que julgavam uns aos outros por supostos graus de proximidade com a base da pirâmide racial brasileira. Para essa investigação, foram analisados jornais piauienses, em busca de discursos raciais; crônicas e romances de literatos locais; textos historiográficos e produções textuais geradas em meio a embates políticos e morais. Além disso, foram utilizadas obras essenciais da historiografia brasileira de autores como Teresinha Queiroz, Wlamyra Albuquerque, Roberto Ventura e Lilia Moritz Schwarcz. O trabalho também dialoga com teóricos fora do eixo ocidental, incorporando conceitos de autores como Frantz Fanon, Achille Mbembe e Sueli Carneiro.