O calazar ou leishmaniose visceral é causado por protozoários do gênero Leishmania (L.infantum ou L. donovani, de acordo com a região). Febre, emagrecimento e aumento do baço são a clínica mais comum. As hemorragias representam um dos principais fatores associados ao risco de morte por calazar, doença grave que resulta em desfecho fatal em até 10% dos casos sintomáticos. Esta tese aborda a dinâmica precoce da coagulação no calazar, estuda intervenções para reduzir a coagulopatia e apresenta um bom biomarcador para predizer o calazar fatal. Estudo 1: O artigo um serviu de base para o desenvolvimento dos outros dois artigos. Essa revisão narrativa com busca sistemática em duas bases, incluindo 78 artigos, apresentou os principais distúrbios da coagulação no calazar e a interação destes com a resposta inflamatória e vice-versa, discutiu a sua fisiopatogenia e as implicações destes no prognóstico do calazar. Estudo 2: o segundo estudo incluiu noventa pacientes com calazar, sendo 48 pacientes que evoluíram para o óbito e 42 sobreviventes. Nós mensuramos IL-1β, IL-6, IL-8, IL-10, IL-12 e fator de necrose tumoral-α (TNF-α), antes do tratamento padrão do calazar. Os resultados mostraram IL-8 elevada e IL-1β, IL-12 e TNF-α diminuídos nos casos de óbito. A IL-8 foi transformada em uma variável dicotômica baseada no ponte de corte de 50 pg/mL e mostrou ser um bom biomarcador para predizer o calazar fatal. Estudo 3: No terceiro estudo, um ensaio clínico de fase II. Todos os pacientes com calazar receberam o tratamento padrão. Destes, catorze receberam também o ácido tranexâmico (TXA) e 19 receberam também o soro fisiológico 0,9% no primeiro dia do tratamento do calazar, escolhidos por randomização. Nós dosamos plaquetas, dímero D, tempo de protrombina (TP) e fibrinogênio, além do cálculo da pontuação de coagulação intravascular disseminada (CID) antes do tratamento e por mais sete dias após o tratamento. Observamos menor contagem de plaquetas, antes do tratamento, no grupo TXA (p=0.028) e maior aumento de plaquetas neste grupo, mas não significativo. Trombocitopenia foi identificada em 90,9% dos participantes, aumento do dímero D em 87,9%, prolongamento do TP em 48,5% e CID evidente em 21,2%. Houve redução significativa dos níveis de dímero D e aumento da contagem de plaquetas no terceiro dia de evolução, sem influência do uso de TXA. Concluímos que os marcadores de coagulação estavam alterados antes do tratamento com melhora significativa no terceiro dia de tratamento, não relacionada ao uso do TXA.