A trajetória biográfica do escritor cubano Guillermo Rosales é atravessada por um extenso histórico de violência, desajustes e frustrações. Perseguido por vozes e visões que o atormentavam, Rosales foi diagnosticado com esquizofrenia ainda durante a adolescência, tendo passado por diversas instituições psiquiátricas ao longo da vida. Parte dessas experiências estão expostas em sua obra de maior destaque, o romance Boarding Home, publicado originalmente em 1987. No livro, Rosales dá voz a seu alter ego, o personagem William Figueras, escritor exilado da Ilha de Cuba que narra sua rotina na condição de interno em um sanatório particular nos Estados Unidos. William expõe os abusos, as situações precárias do hospício e as constantes agressões físicas e psicológicas às quais ele e outros pacientes são submetidos, descrevendo um cenário no qual os sujeitos tornam-se progressivamente despojados de individualidade. Assim, tomando por base o espaço asilar da home enquanto cenário de aniquilação de subjetividades e os efeitos de seu domínio nos processos de “mortificação do eu”, o presente trabalho busca refletir sobre as dinâmicas de deterioração identitária no mundo do internado e os mecanismos de desfiguração pessoal aplicados ao regime de confinamento na Boarding Home. Nessa perspectiva, mobilizam-se, entre outros pressupostos teóricos, as discussões de Erving Goffman (1961) acerca das instituições totais, as reflexões sobre identidade cultural em contextos diaspóricos, de Stuart Hall (2006) e Edward Said (2003; 2005), além dos estudos de Michel Foucault em História da Loucura (1972). As análises foram realizadas com base na edição original do romance, publicada pela editora espanhola Siruela, em 2003. Conclui-se que a Boarding Home, enquanto suposta casa de saúde mental, desvia-se gravemente de sua finalidade terapêutica, na medida em que os personagens incorporam e reproduzem a violência da estrutura hospitalar que os suplicia. Nessas circunstâncias, compreende-se que o espaço manicomial não opera como local de acolhimento ou cuidado, mas como engrenagem institucional de opressão, abandono e extermínio de vidas humanas.