Discorrer sobre produções artísticas de homens e mulheres negros e negras no contexto literário brasileiro contemporâneo, não como objetos passivos da pesquisa, mas como sujeitos legítimos, inventivos por meio da escrita literária, torna-se uma forma de visibilizá-los como protagonistas de suas próprias histórias. Nessa perspectiva, o presente estudo pretende analisar alguns poemas da coletânea América negra & outros poemas afro-brasileiros (2014), do poeta piauiense Elio Ferreira, a qual selecionei como corpus, a fim desenvolver a referida temática à luz do termo escrevivência abordado por Conceição Evaristo, tendo em vista a inserção da autorrepresentação subjetiva e coletiva no contundente registro ficcional artístico, ao tratar sobre aspectos étnico-raciais, sócio-políticos, identitários, memorialísticos e culturais em diálogo ininterrupto entre escrita e vida. A pesquisa se justifica a partir da escre(vivência) do poeta Elio Ferreira, por permitir conhecer não somente a trajetória das experiências pessoais da vida do menino negro, pobre e, dos nove aos vinte anos, ferreiro na oficina de seu pai, Aluízio Ferreira, em Floriano (PI), como também oportuniza, através do fazer literário desse griot, a ressignificação do passado histórico da cultura herdada dos antepassados africanos na América, de modo a refletir e reconhecer a diferença e o valor de um povo que teve sua história obliterada por séculos pelo cruel sequestro diaspórico e violento processo de escravização colonial no Brasil. Diante desse cenário, é possível averiguar poemas do piauiense Elio Ferreira, sob a ótica conceitual de escrevivência conforme apregoado por Conceição Evaristo, em uma sociedade racista e com valores estéticos-ideológicos já construídos na literatura brasileira? Na tentativa de responder essa inquietante problemática, busquei aportes em Almeida (2018), Bezerra (2014; 2019), Bosi (2002), Cuti (2010), Duarte (2011; 2014), Evaristo (2005; 2007; 2009; 2011; 2018; 2020), Fanon (2005; 2008), Ferreira (1997; 2006; 2011; 2014; 2016; 2017; 2018; 2019; 2021;2022), Halbwachs (1990), Hooks (2018), Lima (2014), Kilomba (2019), Mbembe (2014), Munanga (1984; 2020), Nascimento (2002), Ribeiro (2017), Souza (2017), Walter (2017), dentre outros, igualmente importantes, referenciados ao longo da dissertação. Os resultados obtidos sobre a análise dos poemas selecionados da referida coletânea de Elio Ferreira, refletem uma escrita libertadora e afirmativa da identidade negra, como também combatente a um contexto sócio-político, histórico e cultural desumano desde a diáspora, escravização e abolição africana nas Américas. Tudo isso, são marcas de profundos retrocessos históricos na sociedade brasileira. Elio Ferreira procura mostrar através de poemas que as consequências desse passado, ainda são preservados na atualidade, revelado na manifestação, disseminação e persistência do racismo científico e estrutural, na maioria das vezes velado, mas em outras, descarado, quando propagam o preconceito, discriminação, intolerância religiosa e injustiças sociais, aos afrodescendentes/ afro-brasileiros.