A partir da década de 90, o cinema contemporâneo passou a apresentar novas formas de visibilidade, proporcionando protagonismo a temáticas antes marginalizadas. Surge, assim, uma cinematografia que revela novos sujeitos sociais, como as mulheres de países em desenvolvimento, refugiados, sobreviventes de guerras, imigrantes e estrangeiros. Considerando a relevância social do cinema na atualidade, esta pesquisa tem como objetivo analisar a representação política do espaço na filmografia da cineasta libanesa Nadine Labaki, argumentando que a estrutura espacial delineada em suas obras possibilita o desenvolvimento de experiências diversas, contribuindo para a compreensão da alteridade humana. No âmbito deste estudo, serão considerados seus três longasmetragens: Caramelo (2007), E Agora, Aonde Vamos? (2011) e Cafarnaum (2018). Compreende-se que a obra cinematográfica de Labaki converge com a categoria que Andréa França (2003) vem a definir de world cinema (cinema mundial), caracterizado por uma abordagem política e social mais enfática, assim como se observa em outros cineastas, como o iraniano Jafar Panahi e o brasileiro Walter Salles. Nesse contexto, a hipótese que conduz esta investigação é a de que os filmes de Labaki constituem uma espécie de materialização estética da sociedade islâmica, visto que opta por retratar espaços que fortalecem a vivência de personagens excêntricos em meio a uma sociedade assinalada por estruturas opressoras. Esses espaços alternativos desafiam as convenções sociais e desmantelam suas estruturas centralizadoras. Além disso, a pesquisa também explora a discussão sobre a experiência religiosa, em particular o desafio do fundamentalismo nas duas principais crenças presentes no contexto libanês: cristianismo e islamismo. O estudo ainda aborda as relações de território, considerando o conceito de espaço vital na reprodução de uma civilização. Além do atual contexto histórico que se torna relevante, incluindo a chegada de refugiados sírios ao Líbano, o pós-guerra civil e o conflito árabe-israelense. Dessa forma, o cinema político é concebido como um meio de reflexão sobre as crises contemporâneas, sobretudo àquelas imbricadas nos dilemas de território e poder. Sendo assim, para ampliar a compreensão do objeto de estudo, a análise se baseia em fontes primárias e secundárias que explicam as áreas relevantes. No que diz respeito à linguagem cinematográfica, a abordagem é guiada pelos estudos de Martin (2005). A análise do conceito de espaço é embasada nas ideias de heterotopia em Foucault (1987) e alteridade em Lévinas (2005), que concebe este conceito a partir da relação ética do eu com o outro; também serão apreciadas as concepções de espaço de Lefebvre (2008), Bourdieu (1996) e Santos (1992). Para a análise simbólica do espaço e sua relação com o sagrado religioso, são exploradas as contribuições de Eliade (2010). No que tange à compreensão das relações de poder, são consideradas as teorias de Costa (2006) e Foucault (1979). Assim, este estudo pretende destacar como as representações dos tecidos espaciais na filmografia de Labaki possibilitam o desenvolvimento de experiências heterogêneas, promovendo o entendimento da alteridade humana. A pesquisa, no presente estágio, tem mostrado que a filmografia de Labaki constrói espaços que desafiam as convenções sociais e subvertem as estruturas centralizadoras de poder. Estes espaços que a cineasta constrói – marcados pela alteridade – desafiam as estruturas opressoras ao criar ambientes alternativos que contradizem as normas sociais dominantes, sobretudo aquelas que oprimem a mulher.